domingo, 25 de março de 2012

Orhei Vecchi


Na terça-feira, dia vinte e oito de Fevereiro, fui para casa do Bill, o meu próximo anfitrião. Já tinha dito que sim, e depois que afinal ficava em casa da Victoria, e depois que sim outra vez porque ia ficar mais tempo do que planeado... enfim, um bocado para a frente e para trás. Mas o pessoal do couchsurfing tende a ser flexível com estas cenas, o importante é não os deixarmos à espera e não aparecermos.

À tarde fui a Orhei Vecchi. Tinha lido, e tinham-me dito, que tinha uns mosteiros porreiros e não sei quê, e decidi ir dar uma espreita. Fui para o mercado à procura da estação de autocarros. Confusão total! Na Moldávia a maior parte dos autocarros são furgões p’rai de oito ou nove lugares. Ora ali estavam bués. Todas a dizer Chisinau-Numseionde mas nenhuma a dizer Chisinau-Trebujeni, que era o que eu queria. Ia perguntando ao pessoal e, a custo, fui avançando na direcção certa, como chegar a algum lado de olhos vendados a confiar no “quente quente”, “frio frio”. Encontrei um parente de colete luminoso que me disse que aquele autocarro ia para três quilómetros de Orhei Vecchi. Ok, siga. Por um euro e pico lá fui.

Se Chisinau não é nenhuma Nova Iorque, saindo da capital, os arredores não são propriamente a Suiça. Pelo menos nesta altura, em que o campo está com aquela neve suja de quem está quase a dar os seus adeus. O homem da carrinha disse-me quando tinha de sair e eu fui seguindo as placas que diziam algo como “Complexo Histórico de Orhei Vecchi”. Ainda hoje não sei se aquilo eram mesmo três quilómetros apenas... talvez com aquele frio que racha lenha custe mais a passar. Mas lá fui caminhando até que um camião parou para me dar boleia, sem eu ter pedido nada, o que é semopre fixe. Levou-me p’rai cinco minutos e saí quando vi a placa. Daí apanhei boleia de outros gajos que me deixaram no meio de uma aldeia e apontaram “ali para cima” dizendo “mosteiro”. Aquela aldeia era uma ou duas fileiras de casas ao redor de uma estrada esburacada de terra. Ainda assim tinha alguma graça, porque parecia que o pessoal, consciente da situação pobre e inestética em que se encontravam, tinham tentado dar a volta, pintando cenas em azul vivo para alegrar um bocadito. Vi um mosteiro lá em cima, e fui subindo o monte. Quando cheguei lá cima, a viagem já tinha valido a pena, de certa forma. Curti a paisagem que se me entregava. Tanto à minha direita como à minha esquerda havia um vale. À direita o vale era abraçado por um monte onde conseguia ver os tais mosteiros escavados na pedra de que tinha ouvido falar. Quer dizer, eu via buracos enormes, mais ou menos consistentes e pronto, era isso o mosteiro. À minha esquerda um rio tinha parado no tempo e esperava por raios de sol mais corajosos para voltar a mover-se mais harmoniosamente. O Vento tentava empurarrar-me para um lado ou para o outro, e eu deixava-o acreditar que tal feito era possível.

À minha frente o mosteiro. Entrei, a igreja estava fechada. Dei lá umas voltas, subi a um terraço e fiquei lá uma meia hora ao sol a tentar fazer render a minha visita ao mosteiro, já que não era assim uma cena pela qual valia a pena viajar. Era pequeno aquilo. De um portão ao outro havia uns cinquenta metros. E foi precisamente a abrir o portão de saída que vi um monge. Digo e “foi precisamente” como se fosse uma experiência do outro mundo. Não foi. Foi só interessante ver o gajo, de chapéu peculiar e barbudo. Sorrimos um para o outro, ele entrou e eu saí. Há uma característica que quero desenvolver um bocado. É que às vezes tenho um bocado de vergonha, ou pudor, ou cuidado, em tirar, ou pedir para tirar fotos ao pessoal. Assim, mal fechei o portão arrependi-me, pensei trinta segundos e voltei para trás para lhe pedir isto. Mas o gajo era ninja! Evaporou-se completamente! Nada feito.

Por sorte avistei outro ao fundo. E como estava longe ainda lhe bati umas chapas com o zoom. Era um velho de barba comprida que foi fazer não sei o quê junto de uma cruz celta à beira do declive. Entretanto ele veio para cima, passou por mim sem me olhar, e eu deixei-me ficar. Queria ver onde o gajo ia, porque eu tinha visto que havia, no monte onde eu me encontrava, também um mosteiro, ou algo, encrustrado na pedra e com sinais de ter sido utilizado recentemente. Eu só não sabia como lá entrar. O gajo foi caminhando, olhava de vez em quando para trás, e desapareceu, apenas para aparecer passado dois minutos. Acho que foi mijar. Eu deixei-me ficar, a fingir que tirava umas fotografias e ele voltou. Olhou para mim e disse “go” mas querendo dizer “anda” em vez de “vai”. Fui atrás dele e ele abriu uma porta de uma pequena torre com uma cruz no topo. Por detrás da porta vi uma cortina que, quando ele a afastou, percebi que dava acesso ao interior do monte. Era aquilo, tinha conseguido. A humidade era uma loucura. Não é que a tenha sentido, mas no segundo em que entrei naquela divisão de temperatura muito agradável, a lente da minha câmara embaciou por completo.

Foi fixe. Era uma pequena igreja, com uma espécie de varanda, que tinha sido o que eu tinha visto, e ainda com uma antecâmara com onze divisões para onze monges da antiguidade. As divisões não eram mais do que cubículos de três metros quadrados. O velho era simpático, sabia três ou quatro frases e palavras em inglês. Fiquei lá uns cinco minutos, porque não havia mais nada para ver, e bazei.

O caminho de volta teve as suas dificuldades, sobretudo pelo frio que passei. Mais uma vez digo, se aquilo são três quilómetros ou vou ali percorrer dez e venho já... Quando cheguei à estrada principal tinha uma vista completa para uma vila que devia ser Trebujeni. Não fosse avistar um ou outro carro, aquela visão podia ser de há cem ou mais anos atrás. Casas com um aspecto muito básico, todas mais ou menos iguais, estradas de terra e uma igreja muito bonita a destoar completamente. O campo moldavo está, definitivamente, muito atrás.

Fui caminhando p’rai hora e meia, passaram só três carros que não me puderam levar, e cheguei a uma aldeiazita onde comprei qualquer coisa para comer. Entretanto apareceu um forgão que me levou de volta à capital.

dez e quarenta e sete, quarta, sete de março de dois mil e doze
algures entre Odessa e Sevastopol

terça-feira, 20 de março de 2012

Voltas em Chisinau


nota:

 às vezes há aqui cenas mais pessoais da parte de quem mas conta. às vezes nao interessam, outras vezes interessam porque sao cenas em que eu acho que vale a pena pensar. naturalmente, quando assim é, mudo as características que pudessem ajudar a identificar essa pessoa

A Victoria vive sozinha. É uma casa ainda grande, com dois quartos, uma cozinha e uma sala de estar.  Mas nesta semana está lá a ficar o Kevin porque ia ter a visita de um espanhol que conhecera online e não o queria albergar na sua própria casa. Por isso eu fiquei a dormir no sofá da cozinha, o que foi confortável o suficiente.

O Victor tem trinta anos e é de Sevilha. É um rapaz simpático mas muito calado. Assim mo pareceu inicialmente e assim o confirmei. Mas na boa. Como o Kevin ia trabalhar na segunda e eu ia passear, o Victor andou comigo. Chisinau não tem muito que ver, apesar de ser trinta vezes mais avançada e movimentada do que outras vilas por que fui passando. Apanhámos o autocarro até ao centro, e depois caminhámos a rua principal de um lado ao outro. Gosto de algumas igrejas de telhado azul, dá um ar porreiro. Alguns edifícios do estado são até bonitos, ainda que um tanto ao quanto taciturnos. Há muitas mulheres aqui a usar daqueles casaco de peles foleiros. Nem é por eu ser contra casacos de pele, são mesmo foleiros! Mais um indício de que como em certas cenas a Moldávia tem trejeitos do antigamente.

Almoçámos com o Kevin e depois à tarde fomos até ao museu. Modesto mas com algumas cenas fixes. Eu divirto-me sempre a olhar para um pote com três ou quatro mil anos e pensar em quem é que o fez, o que é que bebeu dali, onde foi buscar a bebida e cenas assim. E depois fomos dar mais uma volta. Foi mais ou menos isso. Passámos por um mosteiro também de manhã que, noutra cidade passaria despercebido mas que aqui acaba por ser algo que vale a pena ir ver. Quando o sol se pôs rapei algum frio. Não está tanto frio quanto já esteve, mas ainda assim um gajo gela um bocado.

Tinha combinado encontrar-me com a Victoria às seis fora do seu trabalho, e assim o fiz. Caminhávamos para um bar quando o Kevin lhe ligou, e o Victor foi ter com ele. Fomos ao bar preferido da Victoria, que se ia encontrar com uma amiga da universidade que tinha casado com um ucraniano, país onde vivia. O bar não tinha muito para ser o preferido de ninguém, mas depois ela explicou-me as cenas que lá aconteciam e curti a onda, além de ter tocado muito blues. O dono era amigo dela, e quando entrámos eles sentaram-se dois ou três minutos e ele esteve a dizer-lhe uma cena qualquer baixinho.

- Que é que se passa? – perguntei, quando ela se sentou à minha frente. Atrás de si tinha um pequeno palco improvisado e que servia precisamente para quando alguém queria improvisar qualquer coisa.
- É que... eles aqui têm peças de teatro às vezes pouco convencionais. Quer dizer, nada convencionais. São assuntos que tocam em discriminação e outras cenas mais sensíveis... Tipo uma que vai haver hoje chama-se “Mães Sem Vagina”... eu já a vi e fala um bocado sobre a hipocrisia dos pais exigirem algo aos filhos e depois agirem em contrário... cenas assim.
- Sim, e?
- E o que se passa é que alguém viu e não gostou e foi queixar-se. Agora ele estava a dizer-me que vem alguém do ministério da cultura e podem, ou multá-lo, ou fechar o sítio, ou outras cenas... – disse. Fiquei a pensar naquilo. Mas que cena. Este país precisa de acordar méne! Está bem que cada cultura tem a sua cena, mas quando uma cultura ou modo de estar inviabiliza a liberdade de expressão, está tudo fodido... Efectivamente o gajo apareceu. O dono estava a meter lenha na lareira quando foi chamado a sentar-se com o méne. Pelo que me disse a Victoria, o méne que tinha vindo até nem defendia aquela posição, mas as ordens tinham vindo de cima.
- Estão a pegar também por ele não ter uma licença de teatro... – disse, enquanto os gajos, ao lado, passavam os olhos por umas folhas.

Entretanto chegou a Matilda, amiga de universidade da Victoria, a Marina, com quem não falei muito nessa noite, e a Maria, com quem falei bastante, e que me deixou também a pensar também acerca das nossas decisões e em como jogar pelo seguro para mim não é, certamente, a melhor maneira. Acabámos as nossas cervejas e fomos para outro bar onde os melhores músicos de jazz da Moldávia se reúnem na última segunda-feira de cada mês para umas sessões de improviso. Já não sei como é que começou a conversa mas estava a falar com a Maria acerca do seu noivado. A Maria é uma rapariga atraente de origem russa, soxofonista profissional e está com o namorado desde Julho. Ao cabo de dois meses estava noiva. Mas havia ali algo na forma como ela falava dele que me deixou reticente.
- Ele é inteligente, é carinhoso, simpático... – e ia enumerando várias características que o faziam parecer o homem de sonho de qualquer mulher. Tanto que me parecia que estava a ser demasiado racional.
- Ok... mas ama-lo? – ela olhou para um canto da sala qualquer, como quem prepara a forma de responder.
- Não é aquele amor... mas sinto-me bem com ele. É orgânico, sinto-me bem na sua presença.
- Mas não ficas tipo entusiasmada quando o vais ver... não tens as borboletas na barriga...
- Não... Eu tive uma relação antes desta que me fez muito mal. Amava-o muito e ele a mim, mas estávamos sempre a discutir, eram muitos sentimentos, e eu passei muito mal. E não quero nada assim de novo – respondeu, como se estar apaixonada fosse ter uma infecção.
- Mas não tem de ser assim... é possível uma pessoa gostar verdadeiramente de outra e isso não significar que se passe mal ou se sofra constantemente...
- Sim, talvez... Mas olha... foi uma decisão que tomei. Eu fui tendo ao longo dos anos várias propostas para ir tocar para o estrangeiro... e dizia que não porque estava na outra relação. Depois acabei, tive outra proposta e disse que sim. Tive de comprar um saxofone novo, que custou quatro mil euros. Eu só tinha mil, mas eles disseram que pagavam e depois quando eu me mudasse para a Inglaterra ia pagando. E entretanto estava já mais ou menos numa relação com o meu namorado. E quando lhe disse que ia embora, ele pediu-me para não ir. Levou-me a jantar... ele lê muito... e começou a citar Freud e mais não sei quantos acerca de como as pessoas podem mudar...
- Para quê? – interrompi.
- Bem,... a dizer que ele podia mudar... e que gostava muito de mim e queria tornar aquilo em algo sério, e que se eu ficasse na Moldávia ele me pagava o resto do saxofone e se podiam casar. E olha... eu tomei essa decisão, aceitei e agora é esse o plano – concluiu, mais ou menos. Passei-me um bocado. Não queria meter-lhe bichinhos na cabeça, acho que não era o meu lugar começar ali a discursar acerca de como eu acho isso um plano estúpido. Mas é que acho... e por mais que tente acho difícil distanciar-me e dizer “ah iá cada um escolhe o que quer e tal”. Pois claro que sim. Mas foda-se, se quando o pessoal está perdido de amores e se casa, já assim muitos casamentos acabam na sarjeta, não estará a miúda a condenar-se um bocado aceitando casar-se com um gajo com quem namora há dois meses porque já tem vinte e nove anos e já está na altura de constituir família e ele lhe paga o resto do saxofone?

A noite avançou até à meia e o pessoal dispersou. Estava a chegar a casa com a Victoria quando a Maria, que tinha apanhado um táxi para sua casa, lhe enviou uma mensagem a perguntar se podia aparecer lá. Apetecia-lhe estar mais um bocado. Estivémos na cozinha p’rai quarenta e cinco minutos a falar não sei de quê, até que ela foi embora e nós fomos dormir.

catorze e seis, quinta, um de Março de dois mil e doze
Comrat, Moldávia

segunda-feira, 12 de março de 2012

Aniversário em Chisinau


Houve, de repente, uma conversa que surgiu assim meio não sei como, e que se tornou em algo mais sério, e em algo com que discordei bastante. Eu estava a falar de pessoal que já tinha nadado o canal da mancha algumas vezes, inclusive pelo menos uma pessoa que nadou vinte e quatro horas sem parar. Eu estava a falar da beleza de se propor um desafio e alcançá-lo, sem ser por nenhuma razão do outro mundo, sem ser por nada senão provar a nós mesmos que conseguimos. E de repente estávamos a falar de riscos, e em como não vale a pena cometê-los. O Kevin, concordando consigo a Marina, achavam que viajar para sítios como a Índia, por exemplo, por ser muito perigoso. O Kevin baseava-se numa doença qualquer, que uma pessoa qualquer tinha apanhado, e que era muito perigoso, e que o que era seguro era não ir e não sei quê. A Marina deu o exemplo da irmã da sua mãe, que tinha morrido aos trinta anos, e ela sabe como a mãe sofreu, daí achar que devemos ter muito cuidado com a nossa VIDA porque não é só a nós que interessa. Isso é verdade, ok... é das coisas que nos corta a liberdade, as relaç:oes humanas, mas é algo que vale a pena. Aliás, acho que não vale a pena estar ligado a absolutamente mais nada. Coisas, países, tradiç:oes, actividades, tudo serve para, numa altura ou noutra, nos cortar as pernas e sobretudo as asas. Acho que só as relaç:oes humanas deveriam ter esse poder. Contudo, tem de haver um peso e uma medida. E deixarmos de viver porque o medo nos governa não é VIDA nenhuma. Pá, lá está, isto, para mim... tenho de me recordar constantemente que as pessoas são diferentes. Mas é a minha maneira de ver as coisas. Fiar-nos que aquilo é mau e aquilo é perigoso só porque nos dizem leva a que vivamos contando apenas com aquilo que temos como garantido e deixámos o factor surpresa passar de validade, estragar, e ir parar ao lixo. Não digo “vamos todos tentar ser raptados” mas digo “vamos lá ver se o Paquistão é mesmo assim...”.

No dia seguinte fomos a uma festa de aniversário. Tinha como ideia ir dar uma volta pela cidade, mas achei que uma festa de aniversário de um puto moldavo de doze anos me parecia uma cena bastante típica em que queria participar. Aliás, é por cenas assim que o couchsurfing tem o valor que tem. Se eu estivesse num hostel até podia arranjar companhia, mas duvido que fosse a uma festa de aniversário de um puto moldavo.

O puto era o Christian, que tinha feito doze anos no dia anterior. O seu irmão era o Marius, de nove anos e a Olessa a mãe, uma rapariga de trinta e quatro anos com um sorriso muito parecido ao da Maggie Gyllenghal. Gostei dela. Às vezes um sorriso diz tudo. Há pessoas que têm um sorriso que nos dizem de imediato que são pessoas bacanas. Foi o que senti com a Olessa. Além disso fez-me uma análise que até andei de lado. Tanto na Roménia como aqui na Moldávia já me perguntaram algumas vezes o meu signo. É uma cena à qual nunca liguei nada. A Olessa disse que acreditava nos temperamentos mas que não acreditava nas prediç:oes. Ora, ou ela é uma miúda muito perspicaz ou baseou-se apenas no que leu sobre capricórnios e isso coincidiu. Ou talvez ambos, não sei...
- Que signo és? – perguntou-me.
- Capricórnio...
- Pois, bem me pareceu...
- Como assim?
- Os capricórnios são pessoas muito calmas e inteligentes. Têm uma personalidade forte e nem sempre dão a sua opinião, se sentem que a outra pessoa não está aberta para a ouvir. Mas apesar disso são pessoas que geralmente têm efectivamente a sua própria opinião... – foi dizendo, lentamente. Ora, eu não sou assim tão reservado quanto a dar a minha opinião. Mas também é verdade que algumas vezes acho mesmo que não vale a pena abrir o bico porque a pessoa já decidiu tudo. Mas tento contrariar esta vontade, porque é um bocado preguiça. É um pau de dois bicos... eu acho-me um gajo sensato, e como tal acho que é a minha responsabilidade, por exemplo, contrariar um racista e tentar fazê-lo ver que está errado. Mas se este é um exemplo bastante lógico e que não deixa muita margem de manobra, há outros em que a “verdade” é mais relativa, e duas pessoas com opini:oes distintas também se podem achar sensatos, e que é a sua responsabilidade dar os seus argumentos a quem quer ouvir.

Foi uma tarde bem passada. Além dos putos, a mãe dos mesmos, eu, a Marina e a Victoria, estava lá também o Dani, um russo que vivia na Moldávia e que tinha conseguido recentemente um contracto qualquer para abrir uma empresa em parceria com uns alemães. Até me pareceu bom moço, mas pelos vistos, disse-me a Victoria mais tarde, é daqueles que acha que os homossexuais deviam morrer todos e cenas que tais. Sei que estou a falar muito disto, mas é que se acho que Portugal está a léguas de onde devia estar no que à tolerância e aceitação diz respeito, entristece-me ver que noutros sítios a situação está muito pior.

Por exemplo... acho que  o racismo é um problema que se tem vindo a resolver com um passo à frente da discriminação homossexual. Assim, quero crer que em Portugal já não é um problema de maior. Neste momento o pessoal trabalha em abrir a sua mente para, entre milh:oes de outras coisas, não achar que pessoas juntas é um problema. Mas, pelo que me parece, isto vai por etapas. Se primeiro há quem diga “não e não”, depois há quem já diga “cada um faz o que quer, mas não pode adoptar... porque depois imagina o que a criança vai sofrer na escola com os outros putos”, ou seja está-se a proibir algo de acontecer só porque há uma expectativa de que outras crianças serão educadas para ver aquilo como errado. Esse é um argumento que ainda se usa em Portugal. Pois ontem à noite vi esse argumento ser usado (não em primeira pessoa, mas contado) acerca de uma pessoa branca e uma preta terem um filho. “Eles podem fazer o que entenderem, mas depois imagina o que vai ser para a criança”. Espero estar a fazer-me entender, porque acho isto importante.

Foi uma tarde calma e porreira. Comemos (bastante) e depois passámos umas três horas a jogar monopólio, que eu venci cheio de dinheiro. Assusta-me pensar que há pessoal que usa aqueles truques que eu usei, enganando outros sem fugir à lei, mas na VIDA real. Mas não me vou p;or a falar disso agora.